Elías, esse é o nome do meu
ex-professor, ou pelo menos era, nunca mais o vi mais gordo, provavelmente já
tenha batido as botas, já era velho e fumava uma carteira de Malboro por dia,
do vermelho, ás vezes tirava o filtro para potencializar aquela gostosa
sensação de queda de pressão.
Calças
de cós alto, camisa social por dentro, careca lustrada, e barriga saliente;
Elías além de professor era vidente, desconfiava eu que fosse até pai-de-santo,
eu morria de medo dessas coisas de Exu e Pomba-gira. Imaginei milhares de vezes
o cartaz afixado em algum poste – Pai Elías de Ogum, trabalhos, amarrações,
tarô e búzios – e a fuça do infeliz sorrindo com os aqueles dentes amarelados.
Tinha mania de prever o futuro da molecada – Você vai ser engenheiro, você vai
ser bandido, e você vai morrer antes dos 25 – E a matemática a gente aprendia
se sobrasse tempo entre uma previsão e outra.
Teorema
de Pitágoras eu nem sabia o que era, Tales, acredito que tenha sido algum
artilheiro alemão da copa de 90, e me dei muito mal no concurso da prefeitura
para auxiliar administrativo por não saber o valor do delta. Porém sabia de
tudo e mais um pouco sobre o futuro dos camaradas de sala; sempre soube que a
Claudinha ia ficar grávida de gêmeos fruto daquele namorico com o Fernando, que
o Paulo Henrique ia perder a mãe vítima de um atropelamento de caminhão, e que
o Gordo ia ganhar 15 mil reais no concurso 148 da quina; tudo detalhadamente
previsto dentro da sala de aula.
E o
sacana incrivelmente acertava tudo; o Rogérinho, vítima de uma desinteligência,
ficou três anos atrás das grades, Bernardo que só tirava dez em português, foi
internado compulsoriamente pela mãe em uma clínica de reabilitação para narcóticos,
e a Laís se formou com louvor em arquitetura na Universidade Federal do Rio de
Janeiro, ouvi falar que está no mestrado agora.
Durante
muito tempo, me arrepiava os fios de cabelo só de pensar em cada premonição
acertada, supus até um pacto sombrio entre o professor e o tinhoso Belzebu, mas
depois percebi que o professor Elías não passava de um charlatão. Em meados de
1998, o pilantra me chamou de canto, botou a mão sobre os meus cabelos
embaraçados, fechou os olhos, e disse que um dia eu me tornaria médico
ortopedista, e que seria plenamente feliz depois de vinte e três primaveras.
E nessa
brincadeira de bola de cristal, Elías acertou o futuro de muita gente, talvez
sido chute, acho bem provável. O meu ele passou bem longe, e se fosse adivinho
de verdade, talvez teria previsto a sua demissão no ano seguinte. Nunca
acreditei mesmo nesse negócio de macumba e magia-negra.
(Bruno Ottenio)