quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Pai de Santo e Professor - A história de Elías Gouveia




Elías, esse é o nome do meu ex-professor, ou pelo menos era, nunca mais o vi mais gordo, provavelmente já tenha batido as botas, já era velho e fumava uma carteira de Malboro por dia, do vermelho, ás vezes tirava o filtro para potencializar aquela gostosa sensação de queda de pressão.
                Calças de cós alto, camisa social por dentro, careca lustrada, e barriga saliente; Elías além de professor era vidente, desconfiava eu que fosse até pai-de-santo, eu morria de medo dessas coisas de Exu e Pomba-gira. Imaginei milhares de vezes o cartaz afixado em algum poste – Pai Elías de Ogum, trabalhos, amarrações, tarô e búzios – e a fuça do infeliz sorrindo com os aqueles dentes amarelados. Tinha mania de prever o futuro da molecada – Você vai ser engenheiro, você vai ser bandido, e você vai morrer antes dos 25 – E a matemática a gente aprendia se sobrasse tempo entre uma previsão e outra.
                Teorema de Pitágoras eu nem sabia o que era, Tales, acredito que tenha sido algum artilheiro alemão da copa de 90, e me dei muito mal no concurso da prefeitura para auxiliar administrativo por não saber o valor do delta. Porém sabia de tudo e mais um pouco sobre o futuro dos camaradas de sala; sempre soube que a Claudinha ia ficar grávida de gêmeos fruto daquele namorico com o Fernando, que o Paulo Henrique ia perder a mãe vítima de um atropelamento de caminhão, e que o Gordo ia ganhar 15 mil reais no concurso 148 da quina; tudo detalhadamente previsto dentro da sala de aula.
                E o sacana incrivelmente acertava tudo; o Rogérinho, vítima de uma desinteligência, ficou três anos atrás das grades, Bernardo que só tirava dez em português, foi internado compulsoriamente pela mãe em uma clínica de reabilitação para narcóticos, e a Laís se formou com louvor em arquitetura na Universidade Federal do Rio de Janeiro, ouvi falar que está no mestrado agora.
                Durante muito tempo, me arrepiava os fios de cabelo só de pensar em cada premonição acertada, supus até um pacto sombrio entre o professor e o tinhoso Belzebu, mas depois percebi que o professor Elías não passava de um charlatão. Em meados de 1998, o pilantra me chamou de canto, botou a mão sobre os meus cabelos embaraçados, fechou os olhos, e disse que um dia eu me tornaria médico ortopedista, e que seria plenamente feliz depois de vinte e três primaveras.
                E nessa brincadeira de bola de cristal, Elías acertou o futuro de muita gente, talvez sido chute, acho bem provável. O meu ele passou bem longe, e se fosse adivinho de verdade, talvez teria previsto a sua demissão no ano seguinte. Nunca acreditei mesmo nesse negócio de macumba e magia-negra.


(Bruno Ottenio)