sábado, 28 de maio de 2011

Reajuste

Pseudo-crônica

“Ilmo Sr locatário Paulo Roberto Campos Lopes
Viemos por meio desta, comunicar-lhe que o aluguel do imóvel sitio à Rua Florindo Cibin, nº 781, centro, Americana –SP, sofrerá um reajuste de seis por cento como previsto e formalizado no contrato de locação. À partir de junho, o seu aluguel já será reajustado e incluído os devidos tributos. Caso haja eventuais dúvidas, favor entrar em contato com o nosso departamento financeiro, Obrigada.”

- Escuta aqui ô Boy, que porcaria é essa? – Perguntou indignado o empresário gordo de cabelos brancos ralos.

O motoboy magricela parou imediatamente de fuçar no celular, e foi acometido por um surto de raiva instantânea. Sentiu vontade de responder – Boy é a Puta que lhe paril – mas achou melhor não criar caso.

- É um comunicado campeão.
- E o que essa palhaçada quer dizer?
- É só ler amizade – Respondeu debochando e voltando novamente à atenção para o celular.
- Seis por cento de reajuste, isso é um assalto ! – Esbravejou o gordão esmurrando a mesa.
- Pois é chefe, mãos ao alto! – Tentou descontrair mas não deu certo.
- E você ainda acha graça seu moleque de merda? Isso é inadmissível, não vou pagar seis por cento à mais, nem por decreto, vou consultar meu advogado, vou aos órgãos responsáveis, vou ao PROCON, vou até aos quintos dos infernos, mas não pago seis por cento.
- Ok Chefe, é só assinar o protocolo – Falou mais despretensioso que nunca, com a intenção de finalizar as lamentações. 
- Não vou assinar porcaria nenhuma – Bateu com a caneta na mesa, recostou sobre a cadeira, e cruzou os braços com cara de garoto mimado.

Já sem saco para tanta ladainha, o motoboy se aproximou da mesa do grandalhão, puxou com raiva o protocolo, e o enfio dentro da bolsa sem dizer uma só palavra, fitou-o com os punhos fechados por alguns segundos, virou as costas, e partiu. Antes de cruzar a porta, parou o passo, virou-se, e desabafou.

- É complicado né chefe? Esse negócio de reajuste...O preço do ônibus que eu tomo pra trabalhar, sofreu um reajuste de oito por cento, a gasolina está os olhos da cara, dizem que o reajuste foi pra mais de cinco por cento, esses dias fui comprar o leite dos meus moleques, e o preço estava cinqüenta centavos mais caro, sem contar essas taxas de financiamentos malucas, ainda só não comprei a minha gringa, por conta desses juros abusivos. E sabe o que me deixa mais chateado Doutor, é que ninguém me mandou um comunicado.
Apoiando o queixo com as duas mãos sobre a mesa, o gordão estava imóvel e boquiaberto. Sem dizer nada, fez sinal para o motoboy magricela se aproximar, escreveu algo no ar com uma caneta imaginária como se pedisse de volta o bendito protocolo, socando a mão na bolsa, o motoboy sacou o protocolo amassado e jogou com ar de superior na mesa do empresário. Mas que depressa o gordão assinou o protocolo e fez sinal para o motoboy esperar mais um segundo, levantou-se da cadeira, enfio a mão no bolso, e puxou uma carteira rechonchuda, fuçou o calhamaço de dinheiros por alguns segundos, e a fechou depois de pegar vinte reais.

 - Tome um refrigerante.

                O magricela pegou o dinheiro, o protocolo e socou tudo na bolsa. Saiu satisfeito do escritório, e tomou uma cerveja gelada com ar de malandro orgulhoso no boteco do André.


(Bruno Ottenio)




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