terça-feira, 20 de maio de 2014

Ideologia. Benício quer uma pra viver

Benício andava meio revoltoso pelos corredores da faculdade. “Golpe!”; “Companheiro” e “Pequeno-burgueses” eram as palavras que ele mais gostava de falar. Talvez pela tonalidade fonética que as palavras emitiam  - COM PAN HEI RO – Bonito, não? Ou talvez tenha as lido em algum manifesto secundarista que reivindicava a redução do preço da coxinha vendida pela Tia Vilma na cantina escolar – COMPANHEIROS, o preço desse salgado é um GOLPE! Tia Vilma pensa que somos PEQUENO-BURGUESES; isso tem que acabar!

Dedicava-se integralmente à defesa de sua “organização” política – PSAA (Partido Socialista Anti - Acadêmicos) – e armava os maiores quiprocós se algum pseudo-intelectual – assim Benício os chamava – questionasse as legitimidades de seu grupinho político. Deu um tremendo piti quando a Juliana da pedagogia lhe questionou sobre as verbas desviadas pelo PSAA e quase cobriu o Juninho da biblioteconomia de sopapos quando o rapaz confessou que havia lido Mikhail Bakunin. Sem mencionar as inúmeras brigas e alfinetadas ideológicas via facebook; Benício adorava a tecnologia e a possibilidade de evitar o tête-à-tête.

Mas nem tudo era tormenta da vida do grandalhão mal humorado. Benício sorria às vezes. Principalmente quando cortejava futuros militantes potencialmente revoltosos como ele. Cervejinha no boteco, conversinhas no pé d’ouvido, promessas de cargos importantes na gestão do centro acadêmico [...] Essas e outras tantas artimanhas eram utilizadas como cooptação eleitoreira de jovens órfãos de ideologias. O fortalecimento quantitativo do PSAA nunca ocorreu de fato, mas Benício sempre se empenhou na incansável busca por votos. Num passado recente, até pro meu lado o moção andou se engraçando pelos corredores da faculdade, mas me chamou de reacionário quando faltei a assembleia do CA para fazer a prova de antropologia - Antropólogo de gabinete – esbravejou contra mim.

Em relação as provas, Benício não as fazia, até porque, na concepção do rapaz, ser universitário e estudar é uma tremenda contradição. O foco, de fato, é montar uma chapa com os COMPANHEIROS, ganhar as eleições contra os PEQUENO-BURGUESES academicistas e evitar os possíveis GOLPES que a ~democracia~ venha à sofrer. Revolucionário esse tal Benício, hein!



(Bruno Ottenio)

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