segunda-feira, 29 de julho de 2013

Didelphis axilóide aguda - O fedor de Isaias.


Logo quando nasceu, Isaias foi diagnosticado como uma doença rara chamada “Didelphis axilóide aguda”. A doença inusitada era manifestada de acordo com as variações emocionais do garoto. Quando sentia-se feliz e empolgado com alguma situação corriqueira, seu córtex cerebral liberava endorfinas que simultaneamente lhe causavam um insuportável mau-cheiro nas axilas.
No começo, quando recebia o suculento peito da mãe após os histéricos gritos de fome, o bebê fechava os olhos com cara de satisfeito e exalava o insuportável fedor que desconcertava Dona Edith, a mãe. Não suportava sequer cinco minutos com a criança em teu seio. Edith revirou o país a procura de algum médico que curasse o “defeito” do menino, mas todos lhe davam o mesmo prognóstico: Não há cura, tampouco tratamento. E assim, por falta de opções, Isaias foi crescendo e fedendo absurdamente sempre que sua boca abria um mísero sorriso de felicidade.
Quando entrou na pré-escola, conheceu os cruéis apelidos atribuídos pelos coleguinhas de sala: Subaqueira, Gambazento, Fedô, entre outros tantos. Lanchava sempre sozinho pra evitar as piadócas e quando fazia gols nas aulas de Educação Física ninguém o abraçava nas comemorações. Todavia, quando ia mal nas provas, triste e livre do mau cheiro, todos se aproximavam para debochar mais uma vez do pobre Isaias.
O calvário maior do rapaz ainda estava por vir. Na adolescência, completamente retraído e traumatizado com os anos de catinga, sempre evitava as festinhas da galera. Ficou surpreso quando recebeu o convite do aniversário de 15 anos da Lurdinha, decidiu que iria e que daria um jeito de conter sua euforia; pobre coitado, bebeu demais e intoxicou a festa da moça com tanto mau-cheiro. As apaixonites da adolescência chegaram e junto delas o insuportável fedor de Isaias, por conta disso, o desgraçado jamais teve uma namorada. Seus tios não suportaram ficar na sala junto de Isaias quando o Vasco ganhou o campeonato brasileiro. E assim o rapaz foi vivendo, fedendo sempre que sentia-se bem, conseqüentemente, espantando todos a sua volta.
Os momentos de mau cheiro ficaram escassos ao longo do tempo. Cresceu, arrumou um emprego, formou-se em Engenharia Civil, comprou um apartamento, no entanto jamais livrou-se de sua doença. Perfumes e loções pós-barba eram inúteis nos momentos que o rapaz desatinava a feder. Logo, se viu sozinho, vítima de sua própria felicidade.
Isaias morreu cedo, quarenta e poucos anos, talvez de tristeza, talvez de ataque cardíaco, fumava demais disseram os médicos. Foi encontrado só em seu apartamento livre de qualquer mau cheiro. Em seu túmulo havia os seguintes dizeres: “Aqui jaz Isaias, fedeu demais porque tentou sorrir”.



(Bruno Ottenio)

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Fritas ou nuggets?



               Quem me dera ser bem decidido em qual ônibus subir ou qual cigarro fumar. E lá estava eu, na fila do fast-food que evidentemente escolhi errado no desespero da fome. A atendente ruiva de aparelho nos dentes perguntou-me de forma invasiva – Fritas ou nuggets? – como se fosse simples optar entre as múltiplas possibilidades. Olhei apreensivo para os lados e por uma fração de segundo me afeiçoei às batatas, logo em seguida, minha boca encheu-se d’água em imaginar sabor do frango; era uma decisão difícil. E ali, sendo encarado pelos olhos grandes da moçoila ruiva, divaguei em conflitos proporcionalmente intensos às guerras mundiais.
               Social democracia ou anarquismo radical? Miles Davis ou talvez John Coltrane? Shakespeare Apaixonado ou quem sabe O Último Tango em Paris? Deveria ter citado Foucault nas aulas de sociologia e não Deleuze; talvez ter ido a Moçambique em vez de Angola; queijo a goiabada; geral a numerada; contra-baixo a guitarra; cd’s a vinis – Moço?

- Fritas, por favor! 

(Bruno Ottenio)